2006/06/25

Aventureiros, nós?



Depois de ter percorrido de lés a lés e variadíssimas vezes o Sahara Marroquino e o Sahara Ocidental, eis me pela primeira vez na Mauritânia.

A Mauritânia é um país com uma grande extensão territorial.
É quase duas vezes maior do que a França e um pouco menor que Angola.
Tem muito pouca população, que está quase toda alojada em cidades.
No sul, na capital Noakchot, no norte na maior cidade e maior porto do país Nouadibou, e no centro no maciço de Adrar.

O que vos vou contar aconteceu na região de Adrar, a Trab El Hajra “País da pedra” o coração histórico e comercial do país, onde existiram as grandes e antigas cidades atravessadas pelas caravanas nómadas, Ouadane, Chingueti, Tichitt e Oualata, que desde 1996 estão inscritas pela Unesco, na lista dos monumentos considerados património mundial.

Quando se percorre a Mauritânia,a noção que se tem é espaço, olha-se nos 360 graus em redor e vê-se o infinito, andam-se centenas de quilómetros. sem se ver viv'alma.
São planícies arenosas douradas e onduladas, poucos oásis, mas lindos, dunas de várias formas, algumas enormes, as pistas são de fácil progressão e bastante suaves, estragando pouco os veículos que conduzimos e tal como na neve, por vezes dá mais gozo ir por fora de pista, onde o piso também é bom, mas onde o imprevisto, ou melhor, previsto salto, lomba ou depressão, deve levar a uma ainda maior atenção, para ser evitado.
Os animais durante o dia estão escondidos, vendo-se por vezes lebres ou raposas do deserto, quando os nossos jipes estão em rota de colisão com os seus esconderijos.

Em relação a isto tenho uma estória para vos contar.



ESTÓRIA

Um respeitoso cliente da http://www.saharateam.com/ , professor do Instituto Superior Técnico de Lisboa e motard nos tempos livres, cansado de tantos quilómetros, cheio de calor e farto de tentar evitar tanta erva camelo, resolveu entregar a sua mota a um dos enlatados (pessoa que viaja dentro dos carros) .
O jipinho em melhor condição para o acolher era o meu.
Hesitou um pouco, mas lá veio ter comigo, dizendo-me logo.
-Sei a maneira como você conduz, mas peço-lhe o favor que não faça avarias e que vá devagar, pois tenho medo de andar de jipe (foi a maneira polida, de me dizer "tenho medo da sua condução"), ao que eu acedi de boa vontade e tudo fiz para que o senhor pudesse descansar um pouco e que fosse comodamente instalado, liguei o ar condicionado e deixei de carregar no pé direito, passando a olhar mais para os lados,
mas… eis que na tal rota de colisão me surge uma lebre ….primeiro pensei só em a seguir, para a ver melhor, mas como ela cada vez me dava mais luta, mais velocidade e mais curvas apertadas, comecei a pensar como seria bom comer lebre ao jantar e a corrida ainda se tornou mais intensa, o professor. gritava ao meu lado, pensando eu que era para me entusiasmar naquele principio de luta carro lebre, em que a lebre estava a levar a melhor e a conseguir fintar-me com uma pinta danada.
Como os gritos se intensificaram e também já havia gritos no rádio, que eram do meu chefe, percebi então que o meu passageiro estava aflito com um possível capotanço do jipe e lembrei-me do prometido, abandonei a luta que foi prosseguida pelo meu amigo Didier que conseguiu vingar a minha derrota, indo a lebre directamente para a carrinha onde seguia o cozinheiro, com indicação do repasto.

Ao fim do dia, já no acampamento, preparei-me para ir fazer um ensopado de lebre, é que eu gosto daquilo e já estava com apetite e qual o meu espanto, os mauritanos tinham deitado a lebre fora, e porquê? por ter acabado por morrer sem ter sido sangrada e assim não se pode comer, norma dos muçulmanos.

Outra luta, esta de índole religiosa, esteve prestes a iniciar-se, mas os usos e costumes de cada um devem ser respeitados, assim os muçulmanos respeitem os nossos.

Outro dos animais que também se vê e que hoje sei, devia ser o símbolo do Sporting Clube de Portugal, são as impropriamente chamadas iguanas e cujo verdadeiro nome é lagarto egípcio de cauda espinhosa.
Este bicho adora tudo o que é verde, comendo tudo e até papel dessa cor. Não mete água, pois dizem que se lhes der água morre.

Lagarto, adora verde e não mete água--
-Sporting Clube de Portugal, porquê o leão?

Deixemos isto, para vos contar aquilo que me fez fazer estes escritos.

Mauritânia, paisagens douradas espectaculares, cortadas por elevações cinéfilas, e onde de quando em vez se vêem acácias com formas esculturais talhadas pelos ventos e que fizeram de mim um fotógrafo de árvores, o que por vezes me faz sair das rotas, porque, “já ali” está uma acácia que parece diferente.
Mas o ”já ali”, é ainda maior que no Alentejo e o que parece já ali, está a grandes distancias, pois a grande luminosidade e uma atmosfera sem humidade, dão um máximo de transparência.
As cores são lindas, os oásis com os seus palmeirais deixam-nos ficar boquiabertos .

É por isso que os estúdios de cinema são no deserto, tanto nos E.U.A. como até na nossa vizinha Espanha, onde no único e pequeno deserto europeu, o Deserto de Tabernas, também há um estúdio de cinema.
Mas não é só a luminosidade, os próprios cenários naturais de beleza indescritível, também são um dos motivos.
São estas belezas naturais que me atraem e me fazem ir tantas vezes ao Sahara e que fizeram com que tenha ido à Califórnia e não tenha tido tempo para ir a São Francisco.


Voltemos então à Mauritânia, onde fui pela primeira vez e onde vários jipes com europeus, acompanhados por duas carrinhas com mauritanos, para nosso apoio nos acampamentos, percorrem quilómetros e quilómetros de bela vastidão e onde só de tempos a tempos surgem como vida, alguns dromedários, que para ali foram trazidos para aproveitamento das pastagens.
Só podemos contar connosco, além da beleza natural não há mais nada, nem abastecimentos, nem combustíveis, nem nómadas, nem qualquer tipo de ajuda, dormida, só em acampamentos.

Sinto-me um explorador, e isto é ou não é uma aventura ?
Pois, mas já vos conto.


HISTÓRIA

No planalto de Adrar , perto de Guelb Richard, cratera feita de vários círculos concêntricos, sendo quatro os principais, uma das poucas formações da terra que se consegue ver a olho nu do espaço e se pensava, ter sido formada pelo impacte de um meteorito, sabendo-se hoje, ser uma formação geológica rara, provocada por um acidente tectónico circular, fica Chingetti, a sétima cidade santa do Islão, com as suas mesquitas sagradas e muitas bibliotecas e no meio fica Ouadane.
Estas cidades que foram esplendorosas desde a sua formação no sec. XII D.C. até ao sec XVII faziam parte da rota dos comerciantes nómadas que com os seus dormedários atravessavam os desertos, trocando aqui o ouro , marfim e âmbar da África negra por metais, sal, vestuário, perfumes e jóias da região do Maghreb.


OUADANE

Ouadane era uma dessas cidades de comércio, chamadas “ksour”ou cidades fortificadas.

Constituída por três mil casas de pátio interior, das quais, só estão habitadas, hoje, quatrocentas, estando o restante em ruínas, localizadas em labirintos de ruelas estreitas e situada numa encosta do planalto do Dhar, confundindo-se ao longe, pela cor das casas, com o próprio planalto.

Nesta cidade longe de tudo e do mar, que só tem acesso por pista e onde antigamente só se conseguia chegar em caravanas de dromedários, mas que era bem conhecida pela sua actividade científica e cultural e onde eu, na “minha aventura” estava mentalmente fazendo uma “expedição”,------ fundaram os portugueses em 1487, um centro comercial.

Na altura Portugal tinha 1500 000 habitantes e tão grande e longe fomos.
Hoje com
10 000 000 , somos um pequeno país, que o futebol agita.

Aventureiros nós?
Sê-lo-íamos se esta viagem fosse no sec. xv, onde os nossos antepassados de facto o foram, elevando Portugal à potência mundial que fomos, mercê dos conhecimentos científicos possuídos.







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